terça-feira, 25 de novembro de 2008

Endecha

Não sou mais poesia.
Secou em mim a laguna,
ficaram o sal e os corais cortantes.
Só o que sangra, só o que queima.
Não sou mais tua, nem minha,
não sou mais de ninguém, de nada.
Nem noite, nem dia,
só crepúsculo sem fim.
Porque parece, que é preciso dor para cintilar.
Parece que a ferida aberta desperta o sublime.
Não, não sou mais melodia.
Sou corda que estica e ameaça arrebentar.
Tenho uma fome a consumir minhas entranhas.
Tenho meus braços vazios,
um suspiro engasgado,
uma ofensa na ponta da língua.
Na verdade, nunca tive beleza.
Na verdade, tenho um cisco,
alguma coisa feia encovada nas órbitas dos olhos.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Indulto

Quem sou eu para acusar a lua por sua beleza inalcançável?
Na verdade ela não sabe, o que sinto de fato, é que não faço jus a sua luz prateada.
De todas as pessoas, sei que sou a mais marginal.
Mas somente com a lua posso me queixar da dor, de olhar daqui de baixo seu esplendor, sem poder subir aos céus para com ela dançar.
Não, cheia e plena como está, não precisa de uma parva, que orgulhosa se crê estrela.
Mas quando acende esta lua no meu céu, me arrasta para longe os olhos e todo o resto.
Praguejo, esperneio, lua odienta que cega, indiferente lá do alto, irradiando sua prata para todos.
Invento ser merecedora e casta.
Mas sei de minha imprudência contínua, não tenho remissão.
Não. Sou sórdida, inábil, primitiva, quero o sol, quero a lua, quero tudo ao mesmo tempo.
E neste mundo no qual a lua e sol nascem separados, como posso eu querer viver em eclipse?

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Quando se têm medo

Quando se tem Medo, acende-se a luz.
Existem os que apagam-na e preferem ficar no escuro.
Parecem temer até a si mesmos. Por coisa tão imaterial perde-se tanto.
Mas que seja. Imaterial é também o amor e tanto mais.
Quase sempre não percebemos o Medo, nos tomando.
Infiltra-se, invisível, nas pequenas fendas da alma.
É Monstro disfarçado de doce e mentirosa segurança.
Ele entra pela janela como nuvem.
Chove em nossos móveis, dentro de nós.
Deixa-nos com frio.
Paralisa a capacidade de sentir plenamente, de expressar.
Atira fora os deleites de peitos abertos.
E sabe o que acontece?
Passam as horas, os dias, os meses e os anos até.
Nenhum espaço resta mais além do que o Medo ocupa.
Palavras não são ditas, alegrias são adiadas e acabam por se perder.
Assim como o tempo, que Ele leva embora.
Vale tanto assim a confiança inventada de se estar preservando?
Preserva-se de quê?
De tudo que se pode ganhar quando se abandona o Medo de arriscar?
Eu entendo agora. Mesmo que amanhã eu não entenda mais.
É escolha nossa deixá-Lo entrar.
São escolhas. Penso. Dizem. Hesitam. Escolho.
Optei por deixar o Medo ir para longe. Ele só fica porque O chamamos.
Nos seguramos a Ele. Fazemos Dele nosso chão.
Ele permanece com quem se agarra ás suas falsas promessas.
Entristeço, porque há os que apagam a luz e ficam no escuro.
Quando poderiam ver cores com as quais nunca sonharam, não conseguem.
Ficam no escuro porque tem Medo de doerem-lhe os olhos ao acender a luz.
Ficam no escuro e nem podem ver Nova York, nem lugar nenhum.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Ego


Quando era criança e não sabia o que era uma lâmina de barbear, encontrei uma do meu avô, por acaso, e fiquei fascinada. Passei os dedos pequeninos naquele lindo tesouro e logo descobri que coisas belas podem ser perigosas, que as aparências enganam e principalmente que sou imprudente demais.
Sempre fui assim e acabo por me machucar, acabo por machucar os outros. Acabo por estragar tudo.
Rasgo as cortinas, derrubo os vasos e os estatelo. Derramo o vinho nos tapetes e mancho as belas estampas.
Então perco, perco as coisas de valor, tentando achar meu valor próprio.
E algumas vezes acaba sendo tarde demais, ninguém tolera a precipitação.
Tantas vezes giro os ponteiros na direção contrária.
Sinto-me cansada de envergonhar-me por pisar em falso.
Vivo misturando as cores sem saber o tom que vai dar.
Faço a lição ao avesso, assopro e derrubo o castelo de cartas.
Sou assim.
Forço, empurro, puxo e quebro as coisas mais bonitas.
Perco a beleza, a minha e a vossa, pois a leviandade é irmã da indiferença.
Bato as portas com força demais, não consigo ter a noção da intensidade das coisas, flutuo sem ter onde me segurar. Como Delírio.
Falei alto quando deveria ter silenciado, desafinei e saí de todos os tons.
Apaguei as estrelas do céu e fiquei no escuro sem sua companhia amiga.
Não sei medir conseqüências. Por isso fico no escuro.
E mesmo que eu pense em chamar as estrelas, elas não volveriam seus brilhos para a inconstância de uma criança delirante.
Então eu fico no escuro para aprender, aprender a não machucar, a ser cautelosa, a ouvir.
Fico no escuro, até o dia nascer e o Sol chegar.

domingo, 24 de agosto de 2008

Balance

If you believe in light, it's because of obscurity If you believe in joy, it's because of sadness And if you believe in God, it's because of the devil

sábado, 5 de janeiro de 2008

Fronteiras


E foi isto que aconteceu.
Foi assim que me senti.
Sozinha, lá no meio da noite, do dia, das tardes.
Perdida em uma ilha, vendo distantes terras floridas,
O verde e o azul se encontrando, a prata e o ouro se entremeando.
Fantasiando, almejando sublimidades que nem sei se existem.
Gostaria que existissem.
Poder tocar a lua, e não mais planear.
No entanto deixei que morressem com o sol as minhas canções.
Via o Éden, por trás dos meus olhos,
Mas poderia ser qualquer outra coisa.
Tudo pode ser miragem, se não há provas concretas.
Afinal, os olhos são meus, as mãos e a boca também.
Posso ludibriar meus sentidos com o torpor dos meus sonhos.
E sair andando a esmo com os pés descalços.
Até poderia, se percebesse que existe o que vejo em meu imaginário.
Como estar certo de que algo é real?
Não é coragem que me falta, é ciência.
Eu consigo, se souber que é verdade.
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